Priscila Rezende

Os seres humanos necessitam de rituais de passagem para ir além, seja para novas conquistas, seja para abrir mão do que se foi ou experimentar o inesperado. O que a artista Priscila Rezende propõe com sua exposição-funeral-celebração é o início de um novo ritual, que nos possibilita refletir sobre medos, angústias e dores diárias.

A artista expõe processos traumáticos aos quais alguns corpos são expostos de modo recorrente e propõe uma conexão com os espectadores, ao passo que explicita a dor e raiva, assim como o alívio e a possibilidade de cura.

“Aqui Jaz” a indiferença, o medo do outro, a violência física e psicológica.

O projeto de Priscila Rezende foi uma das quatro exposições selecionadas, dentre as quase cem inscritas, no edital do Ciclo de Mostras BDMG Cultural 2023. junto das artistas Vânia Barbosa e Yanaki Herrera e de Yago Gouvêa  

No ano em que o Instituto BDMG Cultural completa 35 anos, continuamos empenhados em contribuir para a reflexão acerca do tempo presente e todos os seus desafios pulsantes.


BDMG Cultural

Teaser da Exposição

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Aqui Jaz

Todos os dias, mulheres são destruídas. Todos os dias, porém, mulheres se erguem em re-existência. Sobreviventes de violências patriarcais que dilaceram seus corpos e subjetividades.

E é sobre suas memórias de sobrevivência que Priscila Rezende tece as obras que formam Aqui Jaz. Trazendo diferentes suportes – fotografia, vídeo-performance e performance – a exposição – que poderia muito bem se chamar agosto, pelo forte simbolismo que este mês carrega para a artista – é sobre violência, mas é, antes de tudo, sobre libertação.

Como um ritual de celebração e renascimento, Aqui Jaz produz experiência catártica e busca a escuta de dores compartilhadas. Isso porque Priscila não está só: a ferida aberta, suturada em cada imagem e frase que compõe a exposição, transpassa outras existências, uma vez que, na encruzilhada identitária que forja sua força, temos os maiores índices de violência. Mulheres negras são maioria em taxas de trabalho infantil, subemprego e encarceramento; são a maioria das vítimas nos casos de agressão sexual, violência doméstica e feminicídios. Assim, mulheres negras são marcadas pelo trauma colonial. Mas não são corpos dóceis. Por isso, em cada imagem de Aqui Jaz ressoa também a revolta, a raiva que, antes de tudo, almeja balançar as estruturas patriarcais que nos agrilhoam cotidianamente.

A exposição é sobre violência. Mas é também sobre romper silêncios. Sobre devorar e vomitar a palavra de controle que pesa sobre nós. Criada em lar religioso, Priscila conhece muito bem os dogmas que submetem mulheres e filhos ao jugo do PAI.

Recusando o medo e transformando o silêncio em ação, ela denuncia os vínculos entre violência de gênero e religião. Em Provérbios 10:01, enquanto picota trechos bíblicos doutrinadores da disciplina paterna, relata violências sofridas nas mãos de seu genitor. Já em Eu sufoquei e morri inúmeras vezes em sua presença, engole páginas da Bíblia até vomitar. Dando sequência ao ritual de libertação, exorciza traumas ao expor o túmulo de seu agressor no tríptico Eclesiastes 3:00. Afinal, há o tempo de calar e de plantar, mas há o tempo de falar e o de curar.

E se a palavra cura, é por ela que Priscila conecta, em dororidade, seus traumas pessoais à violência sofrida por outras mulheres, tanto na vídeo-performance Agosto – em que as homenageia trazendo seus nomes para o cotidiano da ação – quanto em Gênesis 03:16, performance em que alterna a leitura de relatos de violência a de páginas da Bíblia que, em seguida, mastiga e cospe.

Recusando a docilidade, ela redistribui a violência patriarcal. Como ensina Audre Lorde, toda mulher tem um arsenal de raiva que, usado com precisão, pode alterar radicalmente as estruturas que nos oprimem. Assim, Priscila marca sua resposta em Vindita, sequência fotográfica com delicioso sabor de vingança e dilaceração de alimentos fálicos que reverbera na performance Banquete, em que os alimentos são servidos ao público presente. Assumindo o protagonismo de sua história e se negando a repetir passos já dados, ela enterra suas feridas para cimentar outros mundos possíveis para o feminino corpo da negrura.

Nina Caetano
julho de 2023

Obras e Expografia



Gênesis 03:16
2019

Eu sufoquei e morri inúmeras vezes na sua presença
2021


Eclesiastes 3 (Triptico)
2023




Priscila Rezende


Natural de Belo Horizonte, onde vive e trabalha, Priscila Rezende é artista visual graduada em Artes Plásticas pela Escola Guignard – UEMG. Desenvolve trabalhos em múltiplas linguagens, tendo a performance como produção expressiva em sua trajetória. De maneira catártica, se apropria da raiva e da violência como instrumentos para confrontar o racismo, a misoginia e o machismo. A visceralidade é um traço marcante e recorrente em sua obra, que busca golpear o público com um enunciado direto e claro. Integrou a exposição Um defeito de cor, no Museu de Arte do Rio – RJ; expôs no Centro Cultural São Paulo; 11º Salão de Artes Victor Meirelles- SC; Bienal Mercosul – RS; Corpus Urbis -Oiapoque; Histórias Afro-Atlânticas – São Paulo; SAVVY Contemporary – Berlim; Saldo de Performance – BH/MG. Atuou também no Territori Performance Art Festival -Ibiza; Postcolonial Poly Perspectives – Berlim; Malta Festival – Poznan; What is Left Unseen – Utrecht; Festival Internacional de Teatro y Artes de Calle – Valladolid. Foi artista residente na Central Saint Martins – Londres e Art Omi – Nova Iorque; indicada ao Prêmio Pipa 2021.

FICHA TÉCNICA BDMG CULTURAL

Diretor-presidente
Gustavo Mitre

 

Diretora Financeira
Larissa D’arc

 

Artes Visuais
Érico Grossi

 

Educativo
Paula Lobato

 

 

Identidade e
Projeto Gráfico
Maria T Morais

 

Comunicação
Paulo Proença

 

Estagiária de Comunicação
Bruna Gomes

 

Estagiária de Conservação e
Restauração
Maria Amália

 

 

Comissão de seleção
Ciclo de Mostras 2023

 

Julia Rebouças
Lorena D’arc
Lucas Amorim

 

Fotografia
Dynelle Coelho

 

Vídeo
Lugares do invisível

 

Montagem
Gestalt Produções Culturais

CICLO DE MOSTRAS
BDMG CULTURAL 2023

Vânia Barbosa

Yanaki Herrera

Priscila Rezende

Iago Gouvêa


CRÉDITOS ADICIONAIS
EXPOSIÇÃO Priscila Rezende

Expografia
Carolina Baião
Priscila Rezende

 

Textos
Nina Caetano
Priscila Rezende

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